terça-feira, 13 de julho de 2010

Jornalista Reinaldo Azevedo critica os métodos do jornalismo brasileiro

O PETISMO JORNALÍSTICO ASSALTA A LÓGICA E OPTA PELO MÉTODO CHACRINHA DE ARGUMENTAÇÃO
Escrevi ontem um texto sobre o que chamei jornalismo da mera declaração, em que as grandes estrelas são “Suas Excelências As Aspas”. Vocês sabem: “Fulano disse isso”; “Sicrano nega isso e diz que é aquilo”. E o leitor que se vire, pouco importando se “isso” ou “aquilo” procedem ou não. Se os dois lados forem ouvidos, muitos julgam já ter cumprido a tarefa. Já dá para encerrar o dia e ir reclamar da vida no boteco influente da temporada. É o caso, com laivos de surrealismo, do valor do pedágio em São Paulo e do número de praças no Estado. Aloizio Mercadante, um candidato em busca de uma causa, resolveu fazer da questão o seu cavalo de batalha. Certa imprensa comprou a tese, produz reportagens bucéfalas, repetindo cretinices, e depois vai ouvir o “outro lado”. Uma das coisas, entre tantas, que me incomodam nessa abordagem é que ELA REPETE RIGOROSAMENTE O PT DOS VELHOS TEMPOS, AQUELE QUE FAZIA CRÍTICAS RASAS AO GOVERNO, COM AMPLA REPERCUSSÃO NA IMPRENSA, JOGANDO, DEPOIS, NO LIXO AS PRÓPRIAS PROPOSTAS. Ou alguém coleguinha conseguiria provar que Lula governou com o programa do PT? Os arquivos estão aí: os petistas achavam que superávit primário era uma reserva para pagar banqueiros ladrões. Mas voltemos aos pedágios. Investimentos - Na gestão Serra, por exemplo, fizeram-se cinco concessões à iniciativa privada. Renderam R$ 5,5 bilhões, e as empresas vencedoras terão de investir R$ 8,5 bilhões. A inegável qualidade das estradas sob gestão privada — o Estado conta com 10 das 10 melhores do país — tem um custo, e o dinheiro arrecadado nos leilões vai para mais estradas e obras. As empresas concessionárias têm a obrigação de reparar e manter em condições ótimas as estradas vicinais, que não têm pedágio. Como é possível falar sobre o preço sem sem falar nos investimentos? Uma obra como o Rodoanel não cai do céu. Fazer uma reportagem indagando o usuário se ele acha o pedágio caro ou barato é dessas vigarices jornalísticas e, na verdade, morais que desqualificam o jornalismo. Ora, é claro que ele sempre vai preferir pagar menos — como qualquer um de nós. A questão é saber o que esse “menos” implicaria na infra-estrutura do estado e na qualidade do serviço. “Ah, queremos estradas de padrão alemão, mas pagando o pedágio da Régis Bittencourt, onde vigora o modelo Dilma”. Bem, aí você terá uma estrada com o padrão do modelo Dilma — e as mortes também. E os buracos também. E as quedas de barreira também. E a falta de acostamento também. E a falta de guincho também. E a falta de socorro também. E a falta de telefones também. “Ah, mas há países com estradas tão boas quanto e pedágio mais barato”. Pode até ser. Não se pode comparar um país que ainda demanda pesados investimentos nessa área com outros onde não há mais nada a fazer em matéria de estradas, a não ser zeladoria. As empresas que privatizaram essas cinco estradas terão sob seus cuidados nada menos de mil quilômetros de estradas vicinais, o que vai beneficiar várias cidades. Ao todo, o dinheiro do pedágio serve para obras de conservação de 12 mil quilômetros das vicinais. Mas o senador Aloizio Mercadante pode começar por dar o exemplo. As cidades administradas pelo PT que contam com praças de pedágio poderiam abrir mão, por exemplo, do ISS que arrecadam — sim, os municípios são bastante beneficiados pelos pedágios. Ou então encaminhar ao governo do Estado uma solicitação: “Pedágio na minha cidade, não! A gente não gosta disso aqui”. Sou a favor de que os moralistas pratiquem a moral que prodigalizam. Mudança de modelo - As reportagens pautadas por Aloizio Mercadante também ignoram que já houve uma mudança no modelo de gestão privada das estradas no Estado. Antes, estabelecia-se o valor do pedágio, o valor mínimo da outorga, e vencia a empresa que oferecesse mais por ela. O governo Serra mudou o padrão: estabelece-se agora o valor da outorga e o total de investimentos, e as empresas disputam o pedágio: vence quem oferecer o mais baixo. Essa é outra inacreditável omissão nas reportagens. Como costumo dizer, não é assim porque eu quero ou porque eu simpatize com esse ou aquele. É assim porque é. Ou será que porque trato de um fato sou, então, serrista, e o outro, porque o omite, é apenas uma pessoa “isenta”? Estradas federais - Impressiona-me, com efeito, que as estradas federais, que estão logo ali — não é difícil a nenhum jornalista chegar à Régis Bittencourt ou à Fernão Dias —, não sejam, então, avaliadas. Ora, se há dois padrões de administração de estradas sob concessão privada, que eles sejam cotejados em tudo, inclusive na qualidade e na segurança que oferecem aos usuários. Não só isso: um veículo que transite pela Régis Bittencourt será, como direi?, tão bem-tratado pela pista quanto é um outro que transite pela Bandeirantes ou pela Imigrantes? Isso traz algum custo para o motorista? Não vou aqui indagar qual é o modelo de Mercadante porque, até agora, ele não tem nenhum. Nem mesmo saberia como poderia rasgar os contratos — que a lei se dane, né? — para mudar tudo. Suponho que ele pretende oferecer algo parecido com o dito “Modelo Dilma”. Nas suas mãos, talvez a Anhangüera se transformasse numa Régis, fazendo o estado, nessa área, regredir do Primeiro para o Terceiro Mundo. Número de praças - De todas as abordagens, no entanto, a mais inacreditavelmente cretina é a que faz a conta do número de praças criadas por ano ou que divide o total de quilômetros sob concessão pelo número de postos. Petista, especialmente quando na oposição, trata a lógica como inimiga, chuta o seu traseiro, espanca a pobrezinha. Que certo jornalismo caia na conversa, aí já é demais. Digam-me cá: se, em vez de 100 praças cobrando “x”, houvesse 50 cobrando 2x, o usuário sairia ganhando ou perdendo? A resposta apressada para quem entende um pouquinho de matemática seria esta: “Daria na mesma, Reinaldo”. E eu respondo: errado! Tomem cinco pontos em linha: A-B-C-D-E, sendo “A” o espaço inicial, e “E”, o final, sem praças. Há pedágios a R$ 5 nos pontos B, C e D. Quem se deslocasse de A para E, o trajeto total (que é exceção), pagaria R$ 15. Já o usuário que fosse de A para C, apenas R$ 5; de A para D, apenas 10. Vamos cortar praças de pedágio, já que elas deixam alguns jornalistas muito nervosos. Em vez de 3, apenas uma, ali no ponto B: vai custar R$ 15. Preciso dizer o que aconteceria? Fosse o destino do usuário C, D ou E, pagaria R$ 15. Mais praças com preços menores é melhor para o conjunto dos usuários do que menos praças com preços maiores. É uma evidência lógica. Aí o “mercadantista” empedernido logo sugere: “Já sei, a gente põe uma praça de pedágio só lá no ponto E… Bem, ele não quer andar na Bandeirantes, na Anhangüera, na Washington Luiz ou na SP 225 (que leva a Dois Córregos): ele quer andar na Régis Bittencourt; quer enfiar o carão no traseiro de um caminhão para ver se o cérebro pega no tranco. Não venham os petralhas e vigaristas com xingamentos. Os coleguinhas também não precisam ficar amuados e transformar muxoxo em desqualificação: “Esse Reinaldo é tão tucano!!!” Se der para contestar o que vai acima, COM FATOS, que, então contestem. Mercadante tem todo o direito de pleitear o governo do Estado. Se ele não conseguiu, até agora, achar a sua agenda, que fique com essa história de pedágio. Não serei eu a cobrar honestidade de propósito dos petistas. Até porque, vocês sabem, caso Mercadante vencesse, sempre haveria a possibilidade de mudar de idéia, não é? “Pensei bem e decidi revogar a minha crítica irrevogável aos pedágios de São Paulo”. Inaceitável, aí é mesmo, é que setores da imprensa se engajem nessa campanha apelando ao populismo mais rasteiro — “usuário acha pedágio caro” (não me digam!) — e omitindo que a excelência das estradas paulistas, inclusive de boa parte das vicinais, tem um custo. Na sua sanha, violentam até a lógica mais elementar. Sim, este é um texto de opinião. Ninguém precisa concordar comigo. Também não basta me xingar. Que tal, então, tentar provar que os fatos em que essa opinião se ancora são falsos? O que não vale é enganar o leitor e optar pelo Método Chacrinha de Argumentação: “É caro ou não ééé? Vocês querem bacalhaaaauu?”

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