sábado, 9 de junho de 2012

Delta tinha a ficha suja desde 2010 segundo o próprio governo federal, e mesmo assim BNDES continuou a emprestar dinheiro à empresa com juros subsidiados

Do jornalista Reinaldo Azevedo - Há coisas realmente notáveis em Banânia quando a gente junta lé com lé, cré com cré. Reportagem do Estadão indica que a Delta — sim, a Delta! — recebeu R$ 139 milhões em financiamento do BNDES entre 2010 e 2011 — R$ 75,1 milhões só no ano passado. Aí o leitor exigente, que deve ser sempre severo com o analista ou o colunista, tem de perguntar: “E daí, Reinaldo? O que isso tem de errado? Ninguém sabia ainda que a empresa estava envolvida nessa sujeirada!”. Então vamos ver. Há uma questão de fundo, claro!, nessa história toda: “Pra que serve, afinal de contas, o BNDES?, a Mamãe Gansa do capitalismo de estado no Brasil?”. Mas isso deixo para daqui a pouco. Quero me fixar em outro aspecto, que é um escândalo por si mesmo e deveria chamar, por óbvio, a atenção do Ministério Público. Em 2010, a Operação Mão Dupla, da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União, constatou que a Delta estava envolvida em um monte de falcatruas: fraudes em licitações, superfaturamento, desvio de verbas, pagamentos de propina, pagamentos indevidos e uso de material de qualidade inferior ao contratado em obras de infraestrutura rodoviária sob o comando do Dnit. Havia outras 11 empresas no rolo. É uma coisa fabulosa! Mesmo com a Controladoria-Geral da União tendo em mãos o currículo da Delta — e a CGU é um órgão diretamente ligado à Presidência da República —, a empreiteira assinou com o governo 31 novos contratos, no valor de R$ 758 milhões. E agora ficamos sabendo que isso ainda era pouco. O BNDES concedia generosos empréstimos a uma empresa pega fazendo pilantragem. Vocês certamente sabem o que quer dizer o “S” em “Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social”! Por que um banco de fomento precisaria financiar uma construtora que não realiza investimentos de longo prazo, não busca inovação tecnológica, não está envolvida numa atividade de infraestrutura com prazo longo de retorno? Há muito o BNDES virou a caixa-preta do capitalismo de estado no Brasil, que vai elegendo, segundo os ventos da política, seus ganhadores e perdedores. O Tesouro capta dinheiro no mercado com os juros da taxa Selic, injeta no BNDES, que o empresta a alguns eleitos com taxa subsidiada. O conjunto dos brasileiros arca com a diferença. A Delta, com a sua ficha suja desde 2010, não só continuou a celebrar contratos com o governo federal como estava na lista dos aquinhoados pelo bolsa-juro do BNDES. Parte da dinheirama servia para financiar uma impressionante rede de corrupção. Com a ficha que tinha, constatada pela Operação Mão Dupla, a Delta jamais poderia ter continuado a celebrar contratos com o governo; receber financiamento do BNDES, então, é um escárnio. Há muito o ministro Jorge Hage, da Controladoria-Geral da União, deveria ter sido convocado pela CPI. Ele precisa dizer quais providências foram tomadas na sua esfera de competência para advertir a máquina pública de que uma das empresas contratadas por órgãos federais estava roubando o dinheiro dos brasileiros. Também Luciano Coutinho, presidente do BNDES, tem de ser chamado. Eu sou quase tentado a propor uma CPI só para o banco: quais são os critérios que a instituição leva em conta ao conceder um empréstimo? Os órgãos de investigação do governo são ao menos chamados a dizer se existe alguma pendência que diga respeito ao beneficiário da mamata — digo, do “financiamento”? Todos os contratos celebrados por órgãos de estado com a Delta depois da Operação Mão Dupla são essencialmente imorais e suspeitos por sua própria natureza. Pergunta: as outras 11 empresas flagradas na “Operação Mão Dupla” continuam a fazer negócios normalmente com o governo federal? Algo a se verificar".

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