segunda-feira, 20 de maio de 2013

Imprensa mundial tenta proteger Obama de si mesmo. Ou: Escândalo é muito mais grave do que Watergate e contribui para corromper o Estado democrático


Há uma espécie de pacto informal em escala verdadeiramente mundial — e parte substancial da imprensa brasileira não escapa, é claro! — para esconder os crimes cometidos pelo governo Obama no caso da perseguição do fisco a entidades ligadas ao Partido Republicano. Essa mesma imprensa já tinha feito questão de minimizar a quebra de sigilo telefônico de jornalistas. Não há a menor dúvida, a esta altura, de que o primeiro escalão da Casa Branca, gente da estrita confiança do presidente, promoveu perseguição política. Moral e criminalmente, se querem saber, isso é mais grave do que mandar invadir a sede do partido adversário na calada da noite. É claro que estou me referindo ao caso Watergate, que acabou resultando na renúncia de Richard Nixon. E por que é mais grave? Nixon sabia que estava cometendo um crime e, por isso, mandou que a coisa fosse feita à socapa, fora do funcionamento regular do Estado. Ou por outra: como tinha clareza da gravidade da operação, não tentou transformá-la em algo regulamentar, parte dos procedimentos etc. Agora, a coisa é diferente. À luz do dia — como se coubesse a órgãos do Estado, como parte de suas incumbências burocráticas —, órgãos do governo foram mobilizados para perseguir os “inimigos” do presidente — ou, vá lá, do Partido Democrata. Leiam o que vai na VEJA.com. Volto em seguida.
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A advogada Kathryn Ruemmler, conselheira da Casa Branca, sabia “há semanas” que funcionários do Fisco estavam perseguindo grupos conservadores que pediam isenção de impostos. A informação torna cada vez mais difícil para o presidente Barack Obama sustentar a tese – bastante conhecida dos brasileiros – de que ele não sabia de nada. O democrata afirmou que só soube do escândalo quando ele vazou para a imprensa, no dia 10 deste mês. Nesta data foi revelado o caso criminoso em que o IRS (Internal Revenue Service), a receita federal americana, foi usada para intimidar opositores do governo democrata, endereçando-lhes questionamentos que pouco teriam a ver com o escopo de uma investigação fiscal – como perguntas sobre os livros que liam e até mesmo o conteúdo de orações. Neste domingo, o Wall Street Journal, citando fontes da Casa Branca, afirmou que Kathryn sabia do esquema desde o dia 22 do mês passado, quando foi informada pelo Departamento do Tesouro que “um pequeno grupo de funcionários do IRS perseguiu inapropriadamente organizações usando termos como "tea party" e "patriot". Esses termos eram usados para identificar os grupos de oposição ao governo democrata. O departamento que Kathryn comanda trabalha no aconselhamento da Presidência sobre questões legais. Em entrevista ao canal NBC, o porta-voz de Obama, Dan Pfeiffer, tentou afastar Obama do escândalo. “Lidamos com a questão da forma mais apropriada. Como eu disse, não tivemos qualquer interferência na investigação. Seria um escândalo, isso sim, se tivéssemos nos envolvido nela”, disse. A tentativa de blindar o presidente, no entanto, esbarra em outros depoimentos, como o de J. Russell George, inspetor-geral do Tesouro americano para a administração de impostos. Na sexta-feira, em audiência no Congresso, ele disse que a cúpula do governo foi informada em junho do ano passado, a cinco meses da eleição presidencial, de que havia uma investigação em andamento sobre a perseguição do Fisco. A declaração de George comprova que as investidas do IRS contra grupos de oposição eram de conhecimento do alto escalão – e com isso reforça a idéia de que a máquina do governo, no mínimo por omissão de quem poderia ter interrompido imediatamente os abusos, foi usada para atingir inimigos políticos.
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Voltei
Não há nada mais parecido com as patacoadas petistas no Brasil do que a fala de Dan Pfeiffer, segundo quem o presidente de nada sabia e que absurdo seria se o governo tivesse se metido na investigação. Uma ova! Afinal de contas, a perseguição era promovida por esse governo. Fato para o qual não há resposta: mesmo depois do alerta, as práticas discriminatórias continuaram. A perseguição ficou evidente em 2012. Só que havia eleições pela frente. A disputa foi difícil. Obama teve 50% dos votos válidos (29% do eleitorado americano), contra 48% de Mitt Romney (27,5% do total). A diferença foi de 2,8 milhões de votos. Só 56,4% dos 213 milhões aptos a votar compareceram às urnas. É evidente que é pouquíssimo provável que Obama ignorasse o que estava em curso — ou alguém acredita que Lula ignorava as lambanças do Mensalão? Mas digamos que nem um nem outro soubessem de nada… Cumpriria indagar: que outras ilegalidades se praticavam às costas do nosso Apedeuta e se praticam ainda às do Apedeuta Ilustrado dos Estados Unidos? Fiquemos ainda nessa hipótese menos maligna para um e para outro: por que os aloprados, então, de um governo e de outro, se sentiram à vontade para fazer as safadezas? A resposta é óbvia: porque o ambiente era favorável; porque o ambiente conspirava em favor do crime. Na glorificação estúpida que se operou no Brasil da figura de Getúlio Vargas (o Estado Novo matou muito mais gente do que o regime militar), por exemplo, há, podem perceber, certa tentativa de culpar Carlos Lacerda pelo atentado de que ele e o major Rubem Vaz foram as vítimas — no caso do militar, fatal. O executor do plano foi Gregório Fortunato, o faz-tudo de Getúlio — que também não sabia de nada, claro! Talvez Getúlio não tenha mandado Fortunato praticar o atentado. A questão é saber por que este se sentiu a tanto estimulado. Algo no ambiente que ele respirava lhe dizia que era aquele o modo de tratar os inimigos. Mas derivei um pouco. Volto ao ponto. Os que, na gestão Obama, usaram o Estado para perseguir adversários só o fizeram porque havia, ou há, uma cultura interna que lhes dizia, ou que diz, que se opor ao governo e ao presidente não faz parte do jogo político. Também nos Estados Unidos está em curso, em muitas áreas, um processo de criminalização da política. Isso está presente não só na pena de muitos colunistas pró-governo. A imprensa liberal (leia-se “progressista”) americana demonizou de maneira impressionante o Tea Party. Na questão do abismo fiscal, os republicanos foram acusados de investir no caos do país. A resistência à reforma do sistema de Saúde foi tratada como sabotagem. Da satanização do adversário, passou-se para a satanização da própria política. Ou não vimos Obama, antes e depois de eleito, a atacar os “políticos de Washington”, como se ele próprio fosse de outro planeta? E ele não é, certo? Com um pouco de boa-vontade, hehe, acredita-se que tenha nascido no Havaí… A perseguição empreendida aos grupos conservadores, ligados ao Partido Republicano, é coisa de República bananeira. Como sabem, sempre apontei aqui o lado, deixem-me ver…, terceiro-mundista do jeito Obama de fazer política. Está aí. Reitero: Nixon sabia que invadir o escritório do partido adversário era crime e mandou que se fizesse aquilo à socapa. No caso de agora, não se tomou o cuidado nem mesmo de armar um esquema criminoso paralelo. Tentou-se fazer de conta que, entre as atribuições do Estado, estava perseguir adversários. Não obstante, prestem atenção à sublinha de 90% das coisas que se publicam por aí: há sempre a sugestão de que os republicanos estão exagerando e estão politizando excessivamente a questão, como se o caso não remetesse à política, mas apenas à polícia. Afinal, sabem como é, eles são “progressistas”, e, a essa gente, tudo é permitido, inclusive a prática fascistoide de instrumentalizar a lei para perseguir os que dizem “não”. Não estou surpreso com a coisa em si. Mas confesso que não esperava estar tão certo sobre Obama. Encerro lembrando que uma ocorrência como Watergate, por suas consequências, depura a política e diminui o espaço do Estado criminoso. Uma ação como essa, da gestão Obama, que tende a não punir ninguém de forma exemplar, alarga as possibilidades do Estado delinquente. Por Reinaldo Azevedo

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