terça-feira, 28 de janeiro de 2014

TRIBUNAL DE JUSTIÇA GAÚCHO TOMA UMA DECISÃO ACUSADA DE RACISTA NA ÚLTIMA SESSÃO COM ATUAIS DESEMBARGADORES NO ÓRGÃO ESPECIAL, JUSTO NO DIA MUNDIAL DO HOLOCAUSTO; FOI UM DIA PARA SER ESCONDIDO DA HISTÓRIA

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul teve um péssimo dia nesta segunda-feira. A pauta do Orgão Especial, que reúne 25 desembargadores, tinha a parte administrativa, na qual o assunto era a escolha de lista triplice de nomes de advogados a partir da lista sêxtupla enviada pela OAB, da qual o governador escolherá o nome do novo desembargador do Quinto Constitucional dos advogados. Pois bem, a votação não conseguiu ser completada, por falta de quórum, e a lista está incompleta. Na parte da pauta jurisdicional, o principal processo representou uma profunda vergonha para o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. No dia - 27 de janeiro - em que é reverenciada no mundo inteiro, por decisão da ONU, a memória do Holocausto (seis milhões de judeus mortos pelos nazistas), quando os povos se mobilizam contra o preconceito de qualquer tipo, os desembargadores aprovaram, por 20 a 4, um incidente de inconstitucionalidade na lei do deputado estadual Raul Carrion (PCdoB) que obriga a criação de vagas em todos os Poderes do Estado (Executivo, Judiciário e Legislativo), e assim liquidaram com o mandato de segurança impetrado pelo advogado Paulo Renato Oliveira, o qual buscava que o Judiciário abra vagas para negros, no percentual de sua presença na população gaúcha, no concurso de notariais e escreventes. Resumindo: no dia do Holocausto, os desembargadores entraram para a história como aqueles que estão condenando mais duas gerações de negros gaúchos à segregação, ao afastamento de oportunidades nos serviços públicos, diretos ou extra-judiciais. A coisa começou mesmo mal na tarde desta segunda-feira no Tribunal de Justiça. Antes de se completar 14 horas, quando deveria iniciar a sessão do Órgão Especial, mais de 50 negros, entre pais de santo, mães de santo, carnavalescos, líderes de entidades negras, e jovens negros e negras, reuniram-se na porta do Tribunal de Justiça. Junto estava o ex-governador Alceu Collares. Os seguranças do Tribunal de Justiça, que haviam recebido ordens, barraram a entrada dos negros, provavelmente por causa do medo dos desembargadores de um "rolé da negritude" em seu salão de julgamentos do 12º andar. O advogado Luiz Francisco Correa Barbosa, juiz de Direito aposentado, militante da causa negra, subiu indignado até o 12º andar para falar com o presidente do Tribunal de Justiça e tirar a situação a limpo. Encontrou-se com o corregedor de Justiça no 12º andar e começou a apresentar sua reclamação, pedindo imediata solução para a entrada dos representantes da comunidade negra no prédio. Outros desembargadores se aproximaram, e dois deles reclamaram com o colega: "Vamos sair daqui com a pecha de racistas, já não basta o rolo desse concurso e agora mais essa de proibir os negros de entrar no prédio?!!"  A chegada ao local do presidente do Tribunal de Justiça resolveu a situação. Iniciada a sessão, começou a votação para a escolha dos três nomes da lista tríplice da OAB. A escolha dos dois primeiros nomes foi fácil e rápida. As votações dos nomes dos advogados Ana Paula Dalbosco e Gilberto Koenig saiu em seguida. Mas empacou quando chegou o momento do exame do nome do advogado Sérgio Blattes, um descendente de alemães de Santa Maria, denunciado no livro "Conspiração Rodin", do também advogado João Luiz Vargas (ex-deputado estadual por vários mandatos, ex-presidente da Assembléia Legislativa; ex-conselheiro e ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul). Em seu livro, João Luiz Vargas diz que o colega Sérgio Blattes, de Santa Maria, está na origem das investigações político-policiais da Operação Rodin, comandada pelo peremptório governador petista "grilo falante" Tarso Genro. Sérgio Blattes, por esses vinculações com o PT, especialmente com o deputado federal Paulo Pimenta, e mais recentemente com o deputado estadual Valdeci Oliveira, estaria agora em vias de receber a gratificação pela ajuda no episódio, conforme o livro de João Luiz Vargas, com a nomeação para o cargo de desembargador. A OAB do Rio Grande do Sul, previamente, nomeou o advogado Sérgio Blattes para representar a instituição na comissão de concurso do Tribunal de Justiça, a mesma que recusou abrir reserva de vagas para negros. Pronto, fechou-se o circulo. E aconteceu o que provavelmente não estava no script. Em uma primeira votação, o advogado Paulo Roberto Cardoso Moreira de Oliveira recebeu mais votos do que o descendengte de alemães Sérgio Blattes, mas nenhum dos dois alcançou os 13 votos mínimos necessários. Em uma segunda votação, inverteu-se a situação, com Sérgio Blattes ficando à frente, porém mais uma vez sem os 13 votos necessários. Assim foi suspensa a votação da formação da lista tríplice da OAB. Restou evidente que uma parte considerável dos desembargadores do Órgão Especial, muitos dos quais em sua última sessão (antes da mudança de composição que ocorrerá na próxima segunda-feira), não quiseram comprometer o nome e a história com essa escolha. A seguir sobreveio o desastre, o julgamento em que, por meio de uma formalidade, o Poder Judiciário do Rio Grande do Sul perpetua a segregação dos negros. Os desembargadores consideraram mais importante defender a prerrogativa da iniciativa de envio de leis sobre sua organização administrativa do que o reconhecimento de uma injustiça histórica que afeta os negros neste País. A decisão foi avassaladora, 20 a 4. E aqueles desembargadores que temiam ser chamados de "racistas" tinham razão. As lideranças da comunidade negra saíram do salão de julgamento do Órgão Especial do Tribunal de Justiça absolutamente frustradas. Mas, como são negros e negras que se acostumaram a levar laçaços a vida inteira, já estão se organizando para pressionar por medidas que extingam de vez a segregação e o preconceito bancados pelo Tribunal de Justiça. Durante esta semana acontecerão reuniões para relatar à comunidade o que ocorreu na Corte gaúcha, e também para convocar para as mobilizações que pretendem fazer, sessões com tambores à porta do Tribunal de Justiça nas próximas segundas-feiras, a partir das 14 horas, até que o Poder Judiciário gaúcho acabe com as manifestações de racismo em seus concursos. Ao final da sessão desta segunda-feira já havia desembargador considerando que não é necessário projeto de lei de origem do Judiciário para que os editais dos concursos do Tribunal de Justiça passem a prever reserva de vagas para negros, bastando apenas um provimento baixado pela direção do Poder Judiciário.

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