quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

EDUARDO AZEREDO RENUNCIA PARA VER SE CONSEGUE, AO MENOS, SER JULGADO ANTES DE SER CONDENADO. OU: SE PETISTAS ESTÃO PRESOS, ENTÃO SE DECLARE O FIM DA INOCÊNCIA NO PAÍS


Azeredo: renúncia na esperança de ao menos ser julgado antes de ser condenado
Azeredo: renúncia na esperança de ao menos ser julgado antes de ser condenado
Eduardo Azeredo (PSDB-MG) renunciou ao mandato de deputado federal. Seguindo o procedimento adotado com outras personalidades públicas — inclusive José Genoino em outro processo —, seu caso deve sair do Supremo e ser enviado à primeira instância; no caso, da Justiça Federal de Minas. Renunciou por quê? É incômodo dizê-lo, mas tem de ser dito: porque não seria “julgado” no sentido pleno da palavra; estava caminhando para uma execução. O dito “mensalão mineiro” não foi e não tem sido nem sequer examinado pela imprensa. Já li uma penca de textos pedindo uma espécie de “isonomia”: já que os petistas foram para a cadeia, por que não um tucano? “Tratamento igual para todos!”, gritam! O fundo moral desse alarido é este: JÁ QUE PETISTAS FORAM PUNIDOS, ENTÃO ESTÁ DECRETADO O FIM DA INOCÊNCIA. Ou de forma ainda mais precisa: “Se Dirceu pode ser preso, qualquer um pode”.
O próprio nome “mensalão mineiro” ou “mensalão do PSDB” já é fruto do erro ou da má-fé porque atribui à lambança de Minas Gerais o que não houve e busca eliminar da lambança petista o que houve. Não existiu, e os autos são claros a respeito, um esquema de pagamento a parlamentares, e o dinheiro movimentado não serviu para a cooptação de parlamentares e de partidos. Tendo sido tudo feito conforme está na denúncia, no caso de Minas Gerais, sim, está configurado um caso de caixa dois, com uso das empresas de Marcos Valério, e movimentação de recursos públicos. Sendo verdadeira a denúncia, trata-se, sim, de punir crimes — mas mensalão não é. Ocorre que precisa ser, certo? “Ora, se petista pode ser punido, por que não tucano? Ninguém é inocente!” Vamos seguir.
Azeredo-Lula
O deputado Azeredo andou indagando há dias por que Lula não foi denunciado no esquema petista, e ele sim, no caso mineiro. Foi criticado por isso até por alguns tucanos. Mas a sua pergunta era e é absolutamente procedente. É preciso atentar para estas perguntas e estas respostas.
Por que Azeredo é réu?
— Porque ele é considerado o beneficiário último das irregularidades apontadas.
E quem era o beneficiário último das irregularidades do mensalão?
— Lula. Até o seu marqueteiro foi pago com dinheiro de origem desconhecida, no Exterior.
Então por que Lula não virou réu, e Azeredo sim?
— Vai ver que é porque Lula é Lula, e Azeredo, Azeredo.
Diz a Procuradoria-Geral da República que jamais encontrou indícios materiais de que Lula tenha colaborado com o esquema do mensalão. Notem bem: seu braço-direito foi considerado o chefe do esquema; o presidente e o tesoureiro do seu partido sabiam de tudo; o então presidente foi ao menos advertido sobre o esquema irregular de pagamentos; Marcos Valério disse em depoimento que Lula sempre teve ciência de tudo. Mesmo assim, réu ele não é. Afinal, falta, segundo a Procuradoria, uma prova, um indício, um elemento material. Nesses casos, não basta a convicção. E a tal Teoria do Domínio do Fato não dispensa provas. “Ah, José Dirceu foi condenado sem elas!” Mentira! Só ignorantes ou pilantras, que não leram os autos, podem afirmar isso.
Mas há ao menos o indício?
“Mas algum indício deve haver, certo?”, indaga e indaga-se o leitor. Sim, há, sim, um recibo com uma suposta assinatura de Azeredo, autorizando uma transferência suspeita de recursos. Acontece que já se evidenciou que a tal assinatura é obra de um estelionatário, que está preso, envolvido nessa e em outras falsificações. O elemento que determinou a transformação de Azeredo em réu nasceu, pois, de um crime.
Aí o petralha assanhado tira as patinhas dianteiras do chão para ver se o labirinto se adapta à postura vertical: “Ah, então quando é tucano, é todo mundo inocente!”. Não! Estou demonstrando como são as coisas e indagando por que um é réu, e o outro não é quando as circunstâncias que fazem com que um seja e com que o outro não seja são as mesmas. Só isso. Como não devo satisfações às milícias da rede, escrevo o que acho que tem de ser escrito.
A atuação de Janot
Mas nada disso contou! Estabeleceu-se que os dois casos são idênticos e que, “se um lado foi punido, o outro também tem de ser”. E, claro, nesse contexto, ressalte-se o estranhíssimo comportamento do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que, num gesto espalhafatoso, decidiu se comportar como órgão acusador, órgão julgador e já estabelecer a dosimetria, pedindo nada menos do que 22 anos de cadeia para o agora ex-deputado e ex-governador.
Seria usado
É evidente que o caso seria usado na campanha eleitoral. O PT talvez não levasse o dito “mensalão mineiro” para a televisão porque não iria jogar pedra sobre o próprio telhado, mas as redes sociais, dominadas por seus milicianos, certamente fariam o trabalho. Aliás, os também milicianos mais graduados, com entrada na imprensa, se encarregaram de igualar os dois “mensalões”, e o jornalismo, em regra, com as exceções de sempre, preferiu ignorar as diferenças.
Não só isso: Azeredo certamente não encontraria, no PSDB, a solidariedade que Dirceu, Delúbio e Genoino encontraram no PT. Se preso e condenado à multa, não se criaria um site para arrecadar dinheiro. A Executiva do partido não emitira notas em série acusando o Supremo de fazer um julgamento político. Militantes não se espalhariam nas redes sociais para patrulhar blogs e sites, afirmando a inocência do deputado. Nada disso aconteceria.
E notem que não estou censurando o PSDB por isso. O partido não o faria até por bons motivos. Aécio Neves, presidenciável e presidente do partido, sempre foi muito discreto a respeito. FHC, liderança simbólica dos tucanos, afirmou acreditar no discernimento da Justiça. É assim mesmo que deve agir um partido da ordem, afinal de contas. Ainda que o PSDB pudesse ter sido mais claro em tratar das diferenças entre o caso petista e o caso mineiro, fez bem em não transformar em ré a Justiça. Não tinha por que repetir a pistolagem moral do petismo contra o Poder Judiciário.
Mas é evidente que isso aumenta a solidão daquele que é transformado em réu. “Mas Azeredo não tinha alguma chance no Supremo?” Não vou fazer exercício de adivinhação. Durante o julgamento do mensalão petista, o notório Ricardo Lewandowski referiu-se mais de uma vez ao “mensalão mineiro”, numa curiosa operação intelectual em que censurava este para relativizar a gravidade daquele. Roberto Barroso, o relator, já discursou algumas vezes afirmando que as irregularidades atingem a todos os partidos etc. e tal. O clima não era dos melhores.
Ironia final
Como o mundo não é plano, registro a ironia final. Walfrido dos Mares Guia, então vice-governador de Minas quando Azeredo era o governador e peça central na organização da campanha do tucano à reeleição — campanha derrotada —, tornou-se, JÁ DEPOIS DE REVELADO O CASO, ministro das Relações Institucionais do… governo Lula! Só deixou o cargo quando o Supremo admitiu o processo, e ele se tornou réu. Deixou o cargo, mas não a amizade. Nota: fez 70 anos, a prescrição dos crimes caiu pela metade, e ele já não é mais réu.
Na semana passada, Lula foi a Minas Gerais lançar a candidatura de Fernando Pimentel ao governo do estado. Viajou no avião de… Walfrido, que hoje é peça importante na estrutura de campanha de Pimentel, conforme noticiou o Painel, da Folha:
 Lula Walfrido
Encerro
Sendo o processo de Azeredo remetido para a primeira instância da Justiça Federal de Minas, é evidente que ele não tem a garantia da absolvição. Mas me parece que, ao menos, aumentam as chances de ser efetivamente julgado antes de ser condenado. E para encerrar mesmo: não adianta a petralha vir aqui torrar a minha paciência. Escrevo o que quero e o penso. Dou uma solene banana para a patrulha. E mais uma para aqueles que ainda tentam se equilibrar sobre as patinhas traseiras: ESTA É A MINHA OPINIÃO, NÃO A DA VEJA.com — que me paga para que eu dê a MINHA opinião, não a sua própria. Está claro? Por Reinaldo Azevedo

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