quarta-feira, 18 de junho de 2014

O PLANO DIRETOR DE SÃO PAULO, O DIREITO QUE TÊM OS VEREADORES DE EMENDAR O TEXTO E UMA RESPOSTA A JOSÉ CARLOS DE FREITAS, PROMOTOR DE JUSTIÇA

Atenção, caros! Terei de fazer uma pequena reconstituição para que vocês entendam o e-mail que me mandou o promotor de Justiça José Carlos de Freitas. Vamos ver.

Escrevi um post ontem sobre o Plano Diretor da Cidade de São Paulo. Está aqui. Cometei também a questão na Jovem Pan (para ouvir, clique aqui).
Qual é o busílis, como informou a Folha nesta quarta-feira, “o Ministério Público pressiona a Câmara de São Paulo para que não sejam aprovadas mudanças no Plano Diretor feitas de última hora. (…) Os promotores ameaçam ir à Justiça caso haja uma aprovação com ‘mudanças de surpresa’ — algo corriqueiro em projetos da Casa. ‘Sustentamos que isso é inconstitucional porque a população tem o direito de saber o que vai acontecer na cidade e não pode haver emendas de última hora”, disse o promotor José Carlos Freitas.”
Muito bem! O que escrevi no blog e comentei na Jovem Pan? Isto:
“Se o ilustre doutor me disser em que texto está escrito que um vereador não pode fazer emendas ao plano diretor antes de ele ser aprovado, dou a ele um chocolate. É espantoso!”
Mais adiante, bem mais adiante, afirmei:
“De resto, essa história de que a democracia, hoje em dia, se dá fora dos partidos é coisa de vigaristas. Dez minutos de pesquisa, e ficará claríssimo que sindicatos, ONGs e movimentos sociais são nada menos do que braços de partidos políticos — no mais das vezes, do PT.”
O e-mail
Muito bem! O doutor José Carlos Freitas mandou à Jovem Pan o e-mail que segue em vermelho. Os destaques são meus. Leiam com atenção porque vou comentar.
A matéria do Reinaldo Azevedo (de hoje) está completamente equivocadae gostaria de esclarecer os pontos, se possível ao vivo no jornal da manhã da JP, uma vez que fui citado nominalmente pelo jornalista, que me ofereceu um chocolate…. se eu provasse que vereador não pode apresentar emendas.
Na verdade, o ofício (em anexo) é esclarecedor para evidenciar a gafe em que incorreu o Reinaldo. O MP não quer evitar emendas, mas que elas sejam submetidas a audiências públicas, como manda as Constituições Federal e Estadual.
Sendo ouvinte cativo da Jovem Pan e, pela manhã, do Reinaldo, acredito que sua credibilidade possa ser confirmada se publicar a notícia ouvindo também o “outro lado”, e reproduzindo os fatos como eles são. Se mesmo assim ele discordar do comportamento do MP, é um direito que lhe assiste, mas não de incluir o Ministério Público e este Promotor no rol dos “vigaristas”, como a matéria sugere.
Gostaria até de conversar com ele (pode repassar este “e-mail” ao mesmo, para ciência).
Att.
José Carlos de Freitas
Promotor de Justiça
Comento
Posso, claro, conversar com o promotor. Como a questão diz respeito a prerrogativas da democracia, então faço o debate público no blog. Vamos pela ordem.
1: Não sou quem decide se ele fala ou não no Jornal da Manhã. Por mim, fala. Aliás, nesta quinta, já estava confirmado que eu estaria (e estarei) na rádio, ao vivo, entre 7h30 e 9h30. Podemos conversar no ar.
2: Não, meu texto não esta completamente equivocado, e direi por quê.
3: Doutor José Carlos precisa entender que sou uma pessoa bem-humorada. Já ofereci chocolate até ao papa. É claro que é uma brincadeira. E que se note: o chocolate, na minha figuração, seria consequência da admissão do meu erro. Como acho que estou certo, doutor José Carlos não terá o chocolate, hehe. Não é desrespeito, não, doutor! É só uma forma que pretendo simpática de propor uma aposta.
4: Doutor José Carlos, a minha credibilidade não depende de “ouvir o outro lado” para emitir uma opinião. Até porque isso é um pressuposto, né? Sempre haverá quem discorde. O que o senhor quer? Que eu escreva o que penso com uma nota de rodapé: “Fulano discorda…”? Não dá, né? O “outro lado” é uma exigência quando se faz alguma acusação. Eu não o acusei de nada. Só insisto que não existe lei que impeça um vereador de fazer uma emenda ao Plano Diretor ou que obrigue a emenda a ser submetida a uma consulta pública. É uma opinião compartilhada por ministros do Supremo. Se o senhor recorrer mesmo ao tribunal, verá que falo a verdade.
5: Não o incluí, nem direta nem indiretamente, no rol dos vigaristas, doutor! Se o senhor passar a me ler com alguma regularidade (sei que tem coisas mais importantes a fazer do que isso), verá que nunca “sugiro” nada. Quando eu penso, eu digo. Detesto, aliás, o expediente da afirmação indireta. Eu chamei de “coisa de vigaristas” essa história de que a democracia se dá fora dos partidos. E expliquei, como sempre, os meus motivos: “Dez minutos de pesquisa, e ficará claríssimo que sindicatos, ONGs e movimentos sociais são nada menos do que braços de partidos políticos — no mais das vezes, do PT”. Eu já pago um preço alto demais por escrever o que escrevo. Não tente colocar palavras na minha boca e na minha pena metafórica.
6: Não, eu não cometi gafe nenhuma, mas ouso, sem querer parecer mesquinho, apontar uma na carta que o senhor enviou à Presidência da Câmara, cuja cópia chega anexada a seu e-mail. Também ela segue na íntegra, em vermelho, com destaques meus (exceção feita ao grifo, que é seu). Volto na sequência.
Ofício PJHURB nº 2162/14
Ref.: Autos nº 071/13 – 4º PJ
São Paulo, 14 de maio de 2014.
Senhor Vereador Presidente,
Cumprimentamos Vossa Excelência e, na oportunidade, considerando o trâmite dos trabalhos de discussão e aprovação do Plano Diretor Estratégico da Cidade de São Paulo (PL 688/13); considerando a apresentação de emendas pelos Ilustres Vereadores; considerando que a votação do Plano Diretor (ou de sua revisão) é ato jurídico complexo, para cuja formação concorrem as vontades dos Poderes Executivo e Legislativo; considerando que a aprovação de lei dessa natureza deve resultar de prévios estudos técnicos, ser precedida de amplos debates com a população e acompanhada de transparência e publicidade (art. 40, § 4º, da Lei 10.257/01 – Estatuto da Cidade; art. 29, XII, Constituição Federal; art. 180, II, Constituição Federal), solicitamos-lhe a especial fineza de, em até 10 dias:
1- encaminhar cópias das emendas apresentadas ao PL 688/13;
2- esclarecer se as emendas foram submetidas à análise da Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente, assim como à discussão com a população, em regulares audiências públicas, na forma de devolutivas;
3- encaminhar cópias dos respectivos pareceres, conclusões ou documentos emitidos pela sobredita comissão, relativamente às emendas apresentadas;
4- encaminhar cópias dos estudos e/ou pareceres que resultaram na criação de novas Zonas Especiais de Interesse Social – ZEIS por essa Casa Legislativa;
5- encaminhar cópias de todas as emendas que forem apresentadas até a votação final pela Câmara Municipal.
Outrossim, formulamos recomendação no sentido de serem submetidas todas as emendas existentes, e as que forem apresentadas até a votação final, à análise da Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente da Câmara Municipal, bem como à população, na forma de audiências públicas devolutivas, garantindo o cumprimento dos princípios da transparência, da publicidade e da participação popular, visando evitar futuros e eventuais questionamentos na aprovação desse importante diploma legal.
Ao ensejo, renovamos votos de estima e singular consideração.
José Carlos de Freitas
1º Promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo
Retomo
Começo pela pequena gafe, que é desculpável. O sr. evoca o Inciso II do Artigo 181 da Constituição Federal, mas certamente estava tentando dizer dizer“Constituição Estadual”. É lá que que está escrito o seguinte:
“Artigo 180 – No estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano, o Estado e os Municípios assegurarão:
(…)
II – a participação das respectivas entidades comunitárias no estudo, encaminhamento e solução dos problemas, planos, programas e projetos que lhes sejam concernentes;”
O Artigo 180 da Constituição Federal trata do incentivo ao turismo…
O senhor evoca ainda, como se nota, o Parágrafo 4º da Lei 10.257. Reproduzo o trecho citado:
§ 4o No processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de sua implementação, os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantirão:
I – a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade;
II – a publicidade quanto aos documentos e informações produzidos;
III – o acesso de qualquer interessado aos documentos e informações produzidos.
Comento
Veja bem, doutor, eu estou entre aqueles que entendem, e este certamente não é o seu entendimento, que os requisitos da lei e da Constituição Estadual foram cumpridos no processo de ELABORAÇÃO do Plano Diretor.
Não vejo, e posso lhe assegurar que parte ao menos do Supremo concorda comigo, nada que impeça a apresentação de emendas. Mais do que isso: não vejo nada que as deixe numa espécie de limbo legal. Diga-me: que rito o senhor sugere? As emendas serão, primeiro, submetidas à consulta popular e só poderão ser aprovadas pelos vereadores se forem aceitas naquela instância? Ou então: se aprovadas, ficam em suspenso, esperando o “sim” ou o “não” dos conselhos — ou que nome tenham?
Na carta que o senhor enviou à Câmara, cuja cópia me chega, a palavra“recomendação” aparece assim, em negrito e grifada. Bem, então se trata de RECOMENDAÇÃO, não se obrigação legal, é isso? Se é apenas uma “recomendação”, esta fala que a Folha lhe atribui vale ou não vale:“Sustentamos que isso é inconstitucional porque a população tem o direito de saber o que vai acontecer na cidade e não pode haver emendas de última hora”?
Convenha, doutor José Carlos: há uma diferença abismal entre um promotor dar uma recomendação e afirmar que vai recorrer à Justiça porque seria inconstitucional um vereador apresentar uma emenda ao texto do relator sobre o Plano Diretor.
Temos, obviamente, leituras distintas sobre o conteúdo da lei e da Constituição Estadual (não Federal…). É claro que, falando assim, fica parecendo que sou um sujeito arrogante, que ousa debater com um especialista. Mas eu estou entre aqueles que acreditam que a lei existe também para os simples, como eu. Por isso a tanto me atrevo.
Como estou certo de que haverá emendas, e como o senhor promete recorrer ao Supremo, veremos as nossas respectivas opiniões em debate no tribunal. Um abraço do Reinaldo.  Por Reinaldo Azevedo

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