segunda-feira, 1 de junho de 2015

A reforma política e um desafio a Renan e Jucá. Ou: Pó de pirlimpimpim

O Senado realizou nesta segunda-feira uma sessão solene em homenagem aos 70 anos da reinstalação da Justiça Eleitoral no País. O presidente do TSE, Dias Toffoli, estava presente. O senador Renan Calheiros (PMDB-AL) aproveitou a oportunidade para defender uma reforma política mais ampla. Chamou o sistema eleitoral brasileiro de “anacrônico e ultrapassado”. O presidente do Senado, como a gente sabe, anda propositivo como nunca. Parece que, a cada dia, levanta e entra numa nuvem do pó de pirlimpimpim, a criação de Monteiro Lobato, que conduzia a turma do Sítio do Picapau Amarelo para mundos imaginários e lhe permitia viajar no tempo. Há já alguns meses, o senador vive num estado de permanente aceleração. Ora fala como se fosse presidente da CUT e vitupera contra as terceirizações; ora, como empedernido ultraliberal, cobra a independência plena do Banco Central. Não raro, tem esgares populistas e ataca o ajuste fiscal. Impossível saber onde está Renan. Nesta segunda-feira, defendeu um ponto de vista com o qual concordo: afirmou que a reforma política precisa definir uma cláusula de barreira mais severa do que aquela aprovada na Câmara, que se limitou a vedar o acesso ao Fundo Partidário e ao horário político gratuito de partidos sem representação na Câmara ou no Senado. É claro que é pouco: das atuais 32 legendas, só quatro teriam as limitações: PCO, PSTU, PPL e PCB. O senador que ainda responde no Supremo a um processo por peculato, falsidade ideológica e uso de documento falso, herdado daquele tempo em que se descobriu que uma empreiteira pagava a pensão de uma filha que havia tido fora do casamento e que é também um dos investigados da Operação Lava Jato, defendeu também regras mais rígidas para o financiamento de campanha. Disse ele: “É importante fixar cláusula de barreira que proíba a criação das ‘nanolegendas’ e se colocar fim na promiscuidade do público com o privado, fixando um teto de contribuições para que o candidato não tenha dono e o eleito não tenha patrão. Nosso sistema político-partidário ainda é muito anacrônico, ultrapassado. Esta é a grande oportunidade que temos para reformá-la”. A gente até pode discordar de certas práticas de Renan, mas não dá para contestar a sua fala, não é? Eu também acho que é preciso coibir a multiplicação de pequenas legendas. É possível que o Senado faça proposta diversa daquela aprovada na Câmara. Ocorre que uma emenda constitucional precisa ser aprovada nas duas Casas, em duas votações em cada uma delas, por uma maioria de três quintos. É evidente que o político não pode ter patrão, mas aí é preciso ver o que se quer, na prática, dizer com isso. Proibir as doações de empresas seria como pôr a raposa para tomar conta do galinheiro. Mensalão e petrolão são a prova de que a corrupção não se restringe ao período eleitoral. Um político que é “dono” de cargos em estatais tem como fazer negócios milionários sem que isso incida em crime eleitoral, por exemplo. É preciso insistir neste aspecto: a forma que tomou a investigação da roubalheira na Petrobras convergiu para a demonização das doações de empresas privadas a campanhas eleitorais, como se a sua extinção fosse o remédio contra as falcatruas. Essa é a tese do PT, falsa como nota de R$ 13,00. Extingam-se as doações privadas, e a sem-vergonhice continuará até que o comando das estatais obedeça a critérios puramente político-partidários. Aliás, a melhor maneira de os brasileiros pararem de arcar com o custo-corrupção é privatizando as estatais. Imaginem o que não seriam hoje, só para citar alguns casos, a Embraer, a Vale e a Telebras se ainda nas mãos do Estado. Em vez disso, vejam a altitude que alcançaram esses setores com gestão privada. Romero Jucá (PMDB-RR), vice-presidente do Senado e do Congresso, outro dos investigados na Operação Lava Jato, também criticou os partidos que se tornam fonte de negócios: “Um partido político tem que ser a representação da vontade expressa da sociedade, e não um negócio para uma empresa ou um negócio para vender tempos de TV, caminhos alternativos para mascarar os resultados das eleições. Esse desafio não está na Justiça Eleitoral, mas no Congresso Nacional, na Câmara e no Senado”. Concordo com ele. Mas não podemos enganar a sociedade, não é? Enquanto o estado brasileiro tiver o tamanho que tem, será muito difícil combater a corrupção. Os crimes decorrentes do financiamento de campanha e do comércio praticado por partidos são pinto perto da roubalheira organizada que o gigantismo estatal faculta. Espero que o Senado melhore, sim, a reforma política que sair da Câmara. Mas que a melhore, em vez de piorar. A Casa poderia dar um exemplo de desapego e propor a extinção do malfadado suplente de senador, este estranho ser que, sem o voto de ninguém, assume, com frequência, um dos cargos mais influentes da República. Aliás, eis aí um caso escandaloso de mistura entre os interesses públicos e privados. Não raro, o suplente é uma espécie de financiador do titular, que, uma vez eleito, acaba assumindo um cargo no Executivo, deixando a representação para quem, não tendo voto, investiu, no entanto, alguns milhões na eleição. Com que propósito? Que Renan e Jucá, então, façam o que lhes cumpre fazer no Senado. Por enquanto, a sua crítica à reforma que saiu da Câmara revela apenas a disposição de fazer pequenas provocações a Eduardo Cunha, companheiro de partido de ambos e presidente da Câmara. Com a influência que tem a dupla, talvez seja possível enterrar a excrescência que é haver no Brasil senador sem voto. Coragem, senhores! Dêem o exemplo. Por Reinaldo Azevedo

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