quinta-feira, 11 de junho de 2015

Ihhh… Chico Buarque vai ter de se contentar com a democracia sem orifício!

Por nove a zero, os ministros do Supremo Tribunal Federal deixaram claro que os artigos 20 e 21 do Código Civil não podem ser evocados pelo Poder Judiciário para impor a censura prévia a biografias ou para determinar o recolhimento de livros. Em suma: está morta a polêmica sobre as biografias de pessoas públicas ou que sejam de interesse público. Biografados e seus familiares não terão mais de conceder autorização.

“Ah, então o biografado está desassistido?” Não! O autor do livro pode ser processado, segundo o Código Penal, ora essa! O que se sente atingido também pode solicitar direito de resposta. O que é inaceitável e afronta os Artigos 5º e 220 é a imposição de censura prévia, conforme se vinha fazendo — vale dizer: houve gente conseguindo liminar para impedir uma obra de ser publicada. Não menos graves foram as muitas determinações para que livros fossem recolhidos.
Atenção! Os ministros não estavam julgando a constitucionalidade dos Artigos 20 2 21, que continuam em vigor, com o mesmo conteúdo, a saber:Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.
Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes.
Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.
Tomaram uma carraspana da democracia todos aqueles que fizeram a defesa aberta da censura, como foi o caso de Chico Buarque. Em artigo no Globo, publicado em outubro de 2013, Caetano revelou o que confidenciara Chico:
“‘Mais que a questão da privacidade do Roberto Carlos, eu queria tomar partido dele contra os ataques da imprensa estes anos todos. Também apanhei sozinho de toda a imprensa, 20 anos atrás, por ter criticado a crítica musical do país. Fui por isso chamado de censor, autoritário e até de stalinista. Desta vez, pelo menos, tive o prazer de falar no GLOBO, sem contestação, da censura espontânea da TV Globo nos anos 70.’ (…)”
Parece que o ânimo de Chico era mesmo o da censura. E que, quatro décadas depois de ter sido supostamente barrado na TV Globo (onde chegou até a dividir programa semanal com Caetano), ele queria se vingar impondo censura prévia no país.
Escrevi então um post em que se lia isto aqui:
É espantoso, é estupefaciente, é mesmo inacreditável que Chico, segundo revela Caetano, tenha uma visão ressentida da crítica. Deus do Céu! Tome-se sua obra literária de estreia, um troço ridículo chamado “Fazenda Modelo”. Tratava-se de uma tentativa canhestra de criar um “Animal Farm” com sinal invertido. Se George Orwell fazia uma crítica devastadora e genial ao comunismo, o nosso “poeta” decidiu demolir, de maneira patética, o capitalismo — esse rapaz nunca foi modesto, o que não é um mal em si — desde que o resultado se apresente. Nunca ninguém disse um “a” de negativo sobre esse livro e os outros. Muito pelo contrário. Ele foi “tornado” (se me permitem a construção estranha) o nosso maior “poeta”, o nosso maior “prosador”, o nosso maior “pensador”, o nosso “maior qualquer coisa boa que se queira”… Por ele suspiravam as moças — no tempo em que moças suspiravam. Ainda hoje, numa idade em que é normal esperar mais sabedoria do que sex appeal, é o oráculo dos olhos verdes. Inteligente, bonito, talentoso, progressista, oracular e, como se sabe, “pegador”. Sem querer parecer fescenino, o que a crítica e o jornalismo deixaram de dar a Chico Buarque??? Em alguns casos, não faltou nada, nem a honra…
E Caetano agora nos conta que Chico nem assim se contenta? Está em Paris escrevendo um livro novo, ficamos sabendo. Poderia ironizar aqui e dizer que o alarido dos nativos incomoda a profundidade do seu pensamento, mas soaria um tanto ressentido, né? Afinal, estou com Sêneca, e acho que o homem leva sempre o seu espírito, qualquer que seja o céu que o cubra. Já antevejo o lead dos críticos cuidadosamente escolhidos. Serão variações em torno do óbvio: “Chico pode emitir opiniões incômodas sobre biografias e direito à privacidade, mas o escritor que há nele se exacerba mais uma vez num livro em que a prosa fina e precisa revela…”. Seja lá o que revele, meu caro leitor, será, como sempre, um novo umbral da literatura. Lembro que houve quem considerasse “genial” (isto é: coisa de gênio) a letra “Mulher sem Orifício”…
Encerro
Acabou essa conversa. Está fechado o orifício por onde se queria recriar a censurar prévia no país. Ihhh… Chico Buarque terá de se apaixonar pela democracia sem orifício. Por Reinaldo Azevedo

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