quarta-feira, 3 de junho de 2015

Opor-se à Lei de Responsabilidade das Estatais é opor-se ao controle democrático do estado

O PT está caindo pelas tabelas, mas ainda consegue pautar parte significativa da imprensa. A questão da vez é o anteprojeto apresentado por Renan Calheiros (PMDB-AL) e Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidentes, respectivamente, do Senado e da Câmara, que submete ao crivo do Senado os nomes dos presidentes de estatais. Essa é a principal alteração proposta pela chamada “Lei de Responsabilidade das Estatais”. Há outras. Dilma reagiu e afirmou que fazer tais nomeações é tarefa do Executivo. Renan retrucou e disse ser preciso abrir a caixa-preta dessas empresas. Vamos ver. Aqui e ali, alguns espertinhos dizem que a proposta fere cláusula pétrea da Constituição, uma vez que tal interferência do Senado arranharia a independência entre os Poderes. Tolice. Ninguém está tirando do presidente — e não DA presidente, já que os governantes vindouros também se submeterão a tal crivo, se a proposta for aprovada — a prerrogativa de indicar e depois nomear, assim como faz com ministros de tribunais superiores, os respectivos presidentes das estatais. O que se quer é que eles passem pelo crivo no Senado. “Ah, mas Renan e Cunha, dois investigados da Operação Lava Jato, vão agora propor uma coisa dessas…” Huuummm… Em primeiro lugar, Dilma só não é uma investigada porque Rodrigo Janot faz uma leitura, como posso dizer?, muito especiosa da Constituição e porque se apega pouco ao sentido das palavras, não é mesmo? Em segundo lugar, salvo engano, o petrolão é um escândalo protagonizado pelo PT. Se a dupla de parlamentares perdeu a legitimidade política para legislar, então Dilma perdeu a legitimidade política para governar. Eu só tenho um óbice ao projeto, mas que não tem caráter funcional: como defendo a privatização de todas as estatais — sem exceção —, por desdobramento puramente lógico, deveria me opor também à proposta. Mas não sou do tipo que perde a vida por delicadeza, como diria um poeta. Sei que aquelas porcarias não serão privatizadas tão cedo. Então, que se abram as caixas-pretas. “Ah, mas os respectivos comandos das estatais ficarão subordinados a interesses políticos, vão ser alvos da fisiologia…” É mesmo? Hoje eles já não se prestam ao jogo partidário mais rasteiro, e sem que ao menos possamos debater os nomes escolhidos? Desde que o Senado exerça as suas prerrogativas — a exemplo do que fez na sabatina de Luiz Edson Fachin e na recusa ao nome de Guilherme Patriota para a OEA —, é evidente que a mudança é desejável e faz bem à democracia. Haverá mais transparência nas nomeações. Aí alguém objeta: “Eu duvido que Renan e Cunha proporiam tal coisa se estivessem satisfeitos com o governo; se tivessem tido atendidas as suas reivindicações…” Bem, se algum coleguinha sabe de alguma demanda feita pela dupla, recusada por Dilma, que informe. Eu não sei. Até onde as evidências apontam, o poder de que os dois desfrutam hoje, e que parecem exercer com gosto, deriva do exercício da autonomia. Mas vou além: pouco me interessam, em casos assim, as disposições subjetivas deste ou daquele. Se Renan e Cunha concorrerem, na prática, para ampliar a autonomia do Legislativo e para tornar mais transparente o aparato estatal, melhor; eu apoio. Se e quando, e já demonstrei isso, fazem algo que considero nocivo ao país, eu os critico. Alguém me viu a defender o distritão, por exemplo? Lembram-se do que afirmei sobre a luta de Renan contra a lei das terceirizações? Quem está tentando fazer picuinha contra uma proposta que democratiza o estado brasileiro é o Planalto. A Lei de Responsabilidade das Estatais não diminui o poder do PT ou de Dilma. Ela é maior: amplia o controle da sociedade sobre as estatais. Enquanto formos obrigados a arcar com o peso dessas empresas, que seu comando esteja submetido ao crivo da sociedade. Para arrematar: estivesse em vigência uma lei como a que agora se propõe, a Petrobras não teria chegado à lona. Opor-se a essa proposta corresponde a se opor ao controle democrático do estado. Por Reinaldo Azevedo

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