sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Consultora petista gaúcha diz que José Dirceu indicou empresas do Petrolão para contratos no Perú


"Eu passei a receber pela JD porque o Luiz Eduardo (irmão de Dirceu) assumiu e disse 'Zaida, em vez de fazer o contrato com as empresas, faz com a JD e a gente te repassa. É melhor porque você não se preocupa. A gente cobra aqui e te deposita'. As empresas sempre atrasavam e isso me incomodava. Como eu ia pensar que era coisa errada ou saber se era propina?" Na mira da Lava Jato, a consultora Zaida Sisson de Castro diz ter sido indicada pelo ex-ministro e mensaleiro condenado José Dirceu - preso na segunda-feira, na 17ª fase da operação - para buscar negócios no Peru em benefício de três das empresas alvo da investigação: OAS, UTC e Alusa (hoje, Alumini). Zaida afirma que se reuniu com o dono da UTC, Ricardo Pessoa, apontado como líder do chamado clube do bilhão e um dos delatores do megaesquema de corrupção operado na Petrobras, por intermédio de José Dirceu. E que levou Léo Pinheiro e Cesar Uzêda, da OAS, a uma audiência com o ex-chefe da Casa Civil de Lula e o ex-presidente peruano Alan García na sede do governo, em Lima. A consultora diz ainda que prestou serviços para a SPA Engenharia, que consta na lista de clientes de José Dirceu. Ela confirmou ter trabalhado ainda para a Engevix e para a filial peruana da Galvão Engenharia, da qual recebeu 180.000 dólares. O Ministério Público suspeita que Zaida seja o elo no Peru de um esquema de lavagem de dinheiro que teria sido orquestrado por José Dirceu por meio da JD Assessoria e Consultoria, sociedade do mensaleiro com o irmão Luiz Fernando de Oliveira e Silva, também preso pela Lava Jato. Os procuradores acusam a JD de ter movimentado dinheiro de forma ilícita, sem prestar serviços às empreiteiras que a contrataram. Eles afirmam que "há elementos de prova de que Zaida tenha recebido recursos de propina dessas empreiteiras para atuar em favor das empresas no Peru". A defesa do ex-ministro alega que os serviços a empreiteiras foram de fato prestados, inclusive no Peru - e que os vídeos em que o ex-ministro aparece circulando com desenvoltura no alto escalão do governo do país andino seriam um indicativo disso. "Acho que ele menciona fortemente o Peru para desviar a atenção de outros países, porque no Peru ele não ganhou licitação de nenhuma obra", diz Zaida. A consultora petista gaúcha afirma que José Dirceu pediu a ela reuniões com políticos locais e que abrisse portas no governo peruano a executivos de empreiteiras brasileiras. "Ele foi poucas vezes ao Peru". Zaida tem registro de três viagens de José Dirceu a Lima: em 2007, 2008 e 2009. Mulher de Rodolfo Beltrán, ex-ministro peruano e amigo de Alan García, Zaida transitava no alto escalão do governo e na burocracia estatal. Não chegou a se filiar ao PT, tampouco ao APRA, sigla do marido no Peru, mas fez campanha para os candidatos presidenciais dos dois partidos no início dos anos 2000. Por ter conseguido um breve encontro de García com Lula, em São Paulo, ganhou a confiança do então chefe do Executivo peruano e era chamada de "Zaidita". Ela foi recebida em audiências pelo ex-presidente aprista três vezes no Palácio do governo. Em uma delas, em 23 de janeiro de 2007, levou José Dirceu e executivos da OAS. "Eles queriam investir no Peru e foi uma reunião de apresentação. Nós fizemos um contato, conversamos. Foram lá o Léo Pinheiro e o Cezar Uzêda e nos reunimos primeiro num hotel. Eles me convidaram para trabalhar, chegaram a mandar cópia de contrato, mas não acertamos. Falavam muito mal da OAS, que era ruim de pagar", disse. Zaida contou que foi convidada para trabalhar na Câmara de Comércio Bilateral entre os países e que frequentava eventos de negócios e reuniões na embaixada brasileira. Buscava, porém, contato com construtoras interessadas em abrir negócios no Peru. A consultora disse que conheceu José Dirceu na véspera da primeira posse de Lula no Planalto. Ela e o marido foram apresentados ao homem-forte de Lula por Keiji Kanashiro, que viria a ser secretário executivo do Ministério dos Transportes. "O Keiji nos apresentou ao Zé num bar chamado Bar Brasília, mas nunca mais o vi. Em 2006, em Lima, pensei: tem tanta obra aqui, será que o Zé conhece alguma construtora? Aí resolvi mandar um e-mail para tentar falar com ele por meio da assessoria e deu certo. Tive uma reunião com ele em São Paulo e perguntei se ele conhecia alguma construtora para me indicar e ele disse 'claro, tenho muitas construtoras, me passa os projetos que se aparecer eu te indico'." Ela explica que procurava obras públicas que seriam licitadas no país e enviava por e-mail os documentos à JD Assessoria e Consultoria. O ex-ministro e seu irmão, então, ofereciam os projetos às empreiteiras e indicavam o contato de Zaida para o desenvolvimento das propostas. O registro dos e-mails trocados com José Dirceu e Luiz Eduardo, no entanto, não existe mais, segundo a consultora: "Quando veio esse escândalo da Lava Jato eu apaguei todos", afirma. Depois de uma primeira reunião ou contato, Zaida marcava reuniões com autoridades governamentais responsáveis pela obra, buscava empresas peruanas que poderiam formar parcerias, reservava hotéis para os executivos, apresentava advogados e despachava documentos. "Lembro de reuniões em ministérios e diretorias. Geralmente eu identificava um projeto bom e indicava. Mas conversava antes, por exemplo, com o presidente regional (governador) e perguntava se eu podia levar uma empresa para participar da licitação". Zaida mostrou uma tabela com registros de 35 notas fiscais que somam 500.000 reais emitidas para a JD Assessoria e Consultoria, entre junho de 2008 e setembro de 2011. Cada nota tem valor de 10.000 ou 20.000 reais e, segundo ela, são referentes a consultorias realizadas para a Alusa e a Engevix em solo andino. Ela disse, no entanto, que nunca assinou contrato com a JD. "Quem me levou à Engevix e à Alusa foi o José Dirceu", disse. A JD declarou ao Fisco ter repassado 378.785 reais à Blitz Trading, empresa de Zaida no Brasil. "Não posso dizer se o Zé (Dirceu) recebia propina e não sei se eles prestavam os serviços. O dinheiro que ele me transferiu era da Engevix e da Alusa, não foi propina. Eu trabalhei honestamente. Se a propina que ele recebia ele repassava para alguém não era para mim", alega Zaida. "Eu passei a receber pela JD porque o Luiz Eduardo assumiu e disse 'Zaida, em vez de fazer o contrato com as empresas, faz com a JD e a gente te repassa. É melhor porque você não se preocupa. A gente cobra aqui e te deposita'. As empresas sempre atrasavam e isso me incomodava. Como eu ia pensar que era coisa errada ou saber se era propina?", afirma. "Eu me senti abandonada agora, porque eles (Dirceu e o irmão) ganharam milhões e sabem que estou desde 2012 sem trabalho e meu marido também". A UTC foi uma das últimas construtoras indicadas a Zaida. A empreiteira de Ricardo Pessoa pagou à empresa de Dirceu 1,377 milhão de reais em 2012. Segundo ela, mais uma vez, depois dos primeiros contatos, a tratativa não avançou. "Essa UTC eu fui conhecer. O Luiz Eduardo me chamou e eu fui conhecer esse Ricardo Pessoa em 2013 em São Paulo. Ele disse 'Zaida tu quer conhecer uma empresa que quer ir para lá?' Eu disse que tinha muitos projetos, mas que estava ruim de trabalhar com esse governo (Ollanta Humala), que não tinha conseguido contato nenhum, mas falei que que sairia um projeto de metrô grande, o metrô 2, acho até que mandei o projeto para ele (Pessoa)." Zaida manteve um contrato de consultoria de 5.000 dólares mensais com a filial peruana da Galvão Engenharia, encerrado em 2012. Ela disse que rejeitou uma tentativa de aproximação da matriz no Brasil depois da deflagração da Lava Jato. "O Marcos Wanderley, diretor local, me procurou depois que estourou a confusão e o burburinho da Lava Jato. Ele foi lá em casa e me disse que a Galvão brasileira queria que eu viesse aqui ao Brasil para fazer um contrato com data anterior por aqui. Ele mesmo me aconselhou 'Zaida, não vai. O seu contrato é aqui no Peru. Quem te contratou fui eu'. Eu não vim e não cheguei a ver", afirmou. Segundo ela, o irmão de José Dirceu também telefonou há cerca de quatro meses com um convite para reunião em São Paulo. "O Luiz Eduardo me ligou querendo que eu viesse para conversar com o advogado deles. Eu não vim porque achei que se tivesse alguma coisa suja eles iam querer me induzir para outro lado. Eu trabalhei e sei da verdade, não preciso de advogado para dizer 'vai falar isso e isso…" A consultora confirma informações prestadas em depoimento pelo delator do petrolão e lobista Milton Pascowitch. Ela disse ter acertado uma consultoria para a Engevix, em 2008, durante um café em um hotel de Miraflores, bairro nobre de Lima. Estavam presentes Pascowitch, José Dirceu e os executivos da Engevix, Gerson Almada e José Antunes Sobrinho. Zaida disse ter trabalhado por cerca de oito meses para que a Engevix ganhasse a supervisão de obras no metro de Lima e na Central Hidrelétrica de Machu Picchu. Mas a empreitada não vingou. "Eles não acertaram a proposta de preço e o projeto, então não ganhei nenhuma comissão. Eles sempre diziam 'se a obra sair alguma coisa você vai ganhar'." Com a Alusa, o contato era o diretor César Godoy, que tinha interesse em obras de pequenas centrais hidrelétricas e linhas de transmissão, segundo a consultora: "Eu falava com o César Godoy, que era um dos diretores. Muitas vezes ele veio ao Peru. Eu falava também com os gerentes locais, orientava engenheiros". Zaida não soube dizer o nome de todas as empresas indicadas por José Dirceu e Luiz Eduardo. "Ele indicou várias empresas que se comunicaram comigo, mas não foram ao Peru nem me contrataram", disse. Apesar do primeiro contato em 2006, ela afirma que só conseguiu fechar com as primeiras empresas indicadas por José Dirceu dois anos depois, a Engevix e a Alusa. Zaida afirmou que chegou a trabalhar por cerca de três meses para a SPA Engenharia, sediada em Belo Horizonte (MG) e especializada em ferrovias e rodovias. Ao Fisco, a JD informou ter recebido 780.000 reais da SPA Engenharia, entre 2009 e 2011. "Quem me indicou para a SPA também foi a JD", disse.

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