quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Países emergentes devem ter primeira fuga de capital em quase 30 anos


Os mercados emergentes vão registrar saída líquida de capital este ano pela primeira vez desde os anos 80, dada a piora de suas perspectivas econômicas e os preparativos do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) para elevar as taxas de juros norte-americanas. Essa projeção agravará a preocupação sobre as perspectivas de grandes economias emergentes como a China e o Brasil, que pesarão sobre os dirigentes de bancos centrais e ministros das finanças que se reunirão para as conferências anuais do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, na semana que vem em Lima. O Instituto de Finanças Internacionais anunciou que antecipava que o influxo de capital estrangeiro para os mercados emergentes caísse a apenas US$ 548 bilhões este ano, abaixo do montante registrado em 2008 e 2009, no pico da crise financeira mundial. Combinada à saída de capital externo residente em ritmo acelerado, o instituto afirmou que isso poderia resultar em uma saída líquida de capitais da ordem de US$ 540 bilhões este ano, a primeira vez que isso acontece desde 1988. Em 2014, houve um influxo líquido de US$ 32 bilhões. A perspectiva de um aumento de juros pelo Fed vem apavorando os mercados financeiros o ano inteiro. Um fator que agrava a preocupação é a incerteza quanto ao momento em que o Fed adotará a medida; Janet Yellen, chairwoman da instituição, e seus colegas optaram por não agir em setembro, em parte por conta da turbulência nos mercados mundiais. "Os influxos para os mercados emergentes enfraqueceram muito, em meio a condições voláteis de mercado e uma alta na aversão a riscos", disse Charles Collyns, economista chefe do Instituto de Finanças Internacionais. "Agora projetamos um fluxo líquido negativo, pela primeira vez desde que emergiu o conceito de mercados emergentes, no final da década de 80". Collyns disse que, ao contrário da crise de 2008, os fatores que propelem os fluxos de capital este ano são em geral causados pela condição interna dos mercados emergentes. "Há crescente preocupação sobre a desaceleração no crescimento dos mercados emergentes, amplificada por crescentes preocupações quanto à China e incerteza continuada sobre o momento em que o Fed aumentará os juros norte-americanos", ele disse. "Os fatores que restringem influxos serão persistentes, o que prenuncia uma seca prolongada, e não um alívio rápido". O instituto estima que a saída de capital privado dos mercados emergentes superará o US$ 1 trilhão este ano. Collyns disse que a maior causa isolada de saída de capital era o pagamento de empréstimos tomados em moeda estrangeira por companhias de mercados emergentes, especialmente a China. O instituto estima que o endividamento das empresas não financeiras em mercados emergentes tenha crescido em mais de 500% nos últimos 10 anos, para US$ 23,7 trilhões. "A velocidade com que essa dívida foi acumulada é espantosa", diz Hun Tran, diretor executivo do Instituto de Finanças Internacionais. "Todas as pesquisas mostram que a velocidade com que uma dívida é criada tem papel chave na qualidade dessa dívida e na crise subsequente. Vemos um peso crescente para as empresas endividadas, em seus esforços por manterem em dia as suas dívidas". Fortes desvalorizações em muitas moedas de mercados emergentes, este ano, tornaram muito mais difícil para as empresas endividadas desses mercados manter em dia suas dívidas internacionais, ainda que isso tenha sido mitigado no caso de alguns exportadores que faturam em moeda estrangeira. O instituto estima que a desvalorização cambial tenha elevado as dívidas empresariais do Brasil por um montante equivalente a 7,3% do Produto Interno Bruto (PIB) do país, e na Turquia pelo equivalente a 6,2% do PIB, por exemplo. Outro fator que contribui para a saída de capitais dos mercados emergentes é a liquidação de posições de investimento. Investidores em ações e títulos teriam sacado US$ 40 bilhões no terceiro trimestre, ao que se estima, o pior resultado trimestral desde o trimestre final de 2008, no pico da crise mundial. Uma vez mais, porém, as saídas são diferentes desta vez. Durante a crise mundial e, especialmente, na crise do mercado causada em 2013 pelas primeiras indicações do Fed de que começaria a reduzir seu programa de relaxamento quantitativo, a saída de capitais foi liderada pelos investidores de varejo. "Os sinais são de que as saídas agora venham de investidores institucionais e não só de varejo", segundo Collyns. "Que as instituições também possam estar capitulando é certamente um mau sinal". O FMI alertou esta semana que a alta nos juros dos Estados Unidos e a disparada do dólar podem expor descompassos cambiais e causar calotes empresariais, como resultado das pesadas dívidas acumuladas pelas companhias dos mercados emergentes. A despeito das preocupações sobre a exposição dos mercados emergentes à decisão do Fed, alguns dirigentes de bancos centrais em países emergentes instaram o banco central norte-americano a acabar com a incerteza quanto às suas políticas e aumentar de vez os juros. Dirigentes dos bancos centrais da Indonésia e Peru estão entre aqueles que apelaram ao banco central norte-americano pelo fim do jogo de espera. Yellen declarou, depois da reunião do comitê de open market do Fed em setembro, que o banco central continuava determinado a elevar os juros antes do final de 2015.

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