segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

“Ela nunca confiou em mim”, teria dito Temer. Ou: A estranha frase de Dilma

A presidente não pode tentar cassar os direitos que a Constituição assegura não a Michel Temer, mas ao vice-presidente da República

Por Reinaldo Azevedo - No sábado, em viagem a Pernambuco, a presidente Dilma Rousseff disparou uma de suas frases esquisitas. Não chegava a ser um cachorro atrás de uma criança, mas não era um primor de sentido, embora a gente tenha entendido aonde ela queria chegar. Mandou ver: “Espero integral confiança do Michel Temer e tenho certeza de que ele a dará. Conheço o Temer como político, como pessoa e como grande constitucionalista”. A gente não diz esperar confiança de alguém. Talvez ela tenha querido dizer “lealdade”, mas a palavra certa, como costuma acontecer, fugiu-lhe antes que fosse capturada pela sintaxe. Notem que a presidente evocou até a condição de constitucionalista de seu vice, como a querer dizer: “Ele sabe que o pedido de impeachment não se sustenta…”. Bem, por constitucionalista que de fato é, o peemedebista então sabe não haver nada de errado com a denúncia. Adiante. A Folha informa nesta segunda que Temer afirmou, a pessoas que lhe são próximas, o seguinte: “Ela nunca confiou em mim”. Referia-se, obviamente, a Dilma. Se disse ou não, querem saber?, pouco importa. Uma coisa é inequívoca: a presidente, de fato, nunca confiou no seu vice. Ao contrário: mais de uma vez, fez questão de deixar claro que não confiava. A crise com a base, especialmente com o PMDB (nos tempos em que até Renan Calheiros fazia oposição), levou Dilma a entregar para Temer, em abril, a coordenação política. Em agosto, quatro meses depois, impossibilitado de trabalhar, ele entregava o cargo. E quem opunha obstáculos à coordenação? Ninguém menos do que o então chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante. Os palacianos passaram a cochichar para a presidente que o vice conspirava contra ela; que atuava para tentar lhe tomar o lugar etc. E pronto! Temer entregou o cargo. Quando aconteceu, todas as pessoas razoáveis anteviram um acirramento da crise política. Não porque Temer fosse se comportar como incendiário, o que não é do seu perfil, mas porque, justamente, se tolhiam os instrumentos de um bombeiro. Com a saída, como se nota, tudo piorou. Ora, o que Dilma e os palacianos gostariam que Temer fizesse agora? Que prometesse atear fogo às vestes se ela sair? Que concedesse entrevistas chamando o impeachment de golpe — justamente ele, que vai sucedê-la na hipótese de um impedimento? Ora… É claro que ele não pode fazê-lo. E não pode justamente em razão de seu papel institucional. Diante das mais descabidas pressões, o que se viu foi uma advertência: Eliseu Padilha (ex-Aviação Civil), próximo a Temer, pediu demissão do cargo. Foi, como já escrevi aqui, uma advertência para que as pressões cessassem. Surtiu efeito. A entrevista de Ricardo Berzoini na Folha desta segunda já está mais sóbria. O governo que lute no Congresso, com as armas da democracia. Temer tem de se preservar como aquilo que é, por vontade da Constituição, não de Dilma: alternativa de poder. Se ela confia ou não no peemedebista, problema dela. Dilma só não pode tentar cassar os direitos que a Constituição assegura não a Michel Temer, mas ao vice-presidente da República.

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