quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Centro que convidou físico condenado por terrorismo na França diz que sabia de sua prisão

O Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, divulgou uma carta na qual afirma que, quando convidou o físico franco-argelino Adlène Hicheur para integrar sua equipe de pesquisa, tinha conhecimento de "toda a problemática envolvendo sua prisão" na França. Hicheur, que hoje é professor de Física da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), cumpriu pena na França entre 2009 e 2012 por "associação com criminosos com vistas a planejar um atentado terrorista". Na última segunda (11), o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, declarou que o físico deveria ter sido barrado no Brasil.


No entanto, o diretor de pesquisas sobre o superacelerador de partículas LHC no CBPF, Ignacio Bediaga, disse que, na época em que um coordenador do centro de pesquisa sobre o LHC em Genebra sugeriu o nome de Hicheur, eles chegaram a fazer contato com um embaixador brasileiro para saber sobre sua situação. "Como sabíamos da sua condição de condenado, solicitamos à direção do CBPF na época que fizesse uma consulta sobre se haveria algum impedimento legal para a vinda do Dr. Hicheur ao Brasil", diz Bediaga na carta. "Essa consulta foi feita a um embaixador brasileiro e a resposta foi negativa, já que ele era cidadão francês e já havia cumprido a pena", completa. O julgamento de Hicheur, pesquisador do Cern (o centro de pesquisa nas cercanias de Genebra que abriga o superacelerador de partículas), foi amplamente divulgado por jornais europeus e americanos em 2012. Segundo relatos desses jornais, ele foi detido em 2009 e condenado em 2012 por trocar mensagens que falavam em atingir empresas e pessoas proeminentes na Europa com um interlocutor em fórum da internet usado pela rede terrorista Al Qaeda. Após cumprir parte da pena, Hicheur obteve liberdade condicional em 2012. Apesar disso, a Suíça decidiu, em 2015, proibi-lo de exercer sua atividade profissional no país. Segundo Bediaga, na época da prisão, as opiniões dos cientistas europeus "ficaram divididas com relação à legalidade e à legitimidade" da detenção. "Entretanto, após dois anos de encarceramento, sem acusação definida, houve um consenso entre os nossos colegas da arbitrariedade da ação da polícia francesa e do próprio julgamento", diz. Reportagem publicada pela revista "Época" neste fim de semana mostrou que Hicheur, 39, está no Brasil desde 2013, recebe uma bolsa do governo federal para desenvolver pesquisas e atua como professor-visitante da UFRJ. Ele chegou a receber a bolsa do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) até o fim de 2014 e hoje é professor contratado pela UFRJ. "Podemos atestar, que durante estes quase dois anos de trabalho conjunto, o Dr. Hicheur, além de realizar um trabalho excepcional, mostrou um comportamento moral e ético exemplar, bem como uma grande disponibilidade de colaborar com o grupo", diz Bediaga na carta: "Em nenhum momento houve da nossa parte, alguma percepção de desvio de conduta da sua parte". Bediaga explica que, quando Hicheur deixou a prisão, em 2012, o CBPF — que é associado ao grupo do Instituto de Física da UFRJ — estava trabalhando na análise dos dados do superacelerador de partículas. "O coordenador geral do LHCb à época, prof. [Pierluigi] Campana, entrou em contato com a gente propondo que o Dr. Hicheur viesse para nos auxiliar nas nossas análises", diz. "Conhecedores da capacidade intelectual do Dr. Hicheur, bem como da sua capacidade de trabalho, (...) achamos bem interessante a proposta feita pelo manager do experimento." O franco-argelino teria recebido cartas de recomendação "entusiasmadas" de três cientistas europeus. Após participar de análises no CBPF, Hicheur voltou ao Cern, em Genebra, em março de 2013. Segundo Bediaga, ao terminar seu período de estágio no centro na Suíça, o cientista solicitou um visto de um ano no consulado brasileiro em Genebra. "Ao chegar de volta ao Brasil, iniciou imediatamente o seu trabalho, que foi concluído com sucesso e publicado no Physical Review Letters em meados de 2014, quando teve fim o seu estágio de pós-doutorado no CBPF e foi para a UFRJ como professor visitante", explica.

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