sexta-feira, 3 de junho de 2016

Em protesto, defesa de Dilma abandona comissão do impeachment

A defesa da presidente afastada Dilma Rousseff, coordenada pelo ex-advogado-geral da União José Eduardo Cardozo, abandonou na noite desta quinta-feira a sessão da comissão processante do impeachment no Senado em protesto contra o que considera violação do direito de defesa. Os poucos senadores dilmistas presentes à sessão - Gleisi Hoffmann (PT-PR), Lindbergh Farias (PT-RJ) e Vanessa Graziottin (PCdoB-AM) - também se retiraram da reunião em protesto. Para evitar que a petista não deixe de ser representada, na ação de impedimento, foi nomeada a consultora legislativa Juliana Magalhães como advogada ad hoc. Pouco antes das 20h30, um tumulto tomou conta da comissão processante porque o presidente do colegiado, senador Raimundo Lira (PMDB-PB), decidiu que a maior parte dos 86 requerimentos de produção de provas e de escolha de testemunhas seriam votados em bloco, e não de forma individual e com manifestação de defesa em cada um dos temas. Os senadores dilmistas exigiam discutir um a um e votar separadamente ou então que fosse concedida vista para que os temas fossem apreciados posteriormente. Lira rejeitou a manobra, classificada por senadores da agora base aliada de Michel Temer como "chicana", termo jurídico para indicar uma tentativa de procrastinar o processo. Instantes depois do levante dos dilmistas, o colegiado aprovou a proposta do relator Antonio Anastasia (PSDB-MG) que prevê, por exemplo, que não sejam anexados grampos em que o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, conversa com políticos sobre estratégias que poderiam conter as investigações da Operação Lava Jato e evitar que figurões tivessem seus casos analisados pelo implacável juiz federal Sergio Moro. "A defesa não faz chicana. Na condição de advogado, e na condição de todos os advogados, o exercício da advocacia está sendo desqualifico. Peço vênia a Vossa Excelência, pela ilegalidade da sessão, para me retirar. Um advogado ad hoc que continue. Não tenho condições neste momento, diante do que aconteceu nessa comissão, de aqui permanecer. A sessão pode ficar sem defesa", protestou Cardozo. O presidente do colegiado disse que no meio da tarde concluiu que o bancada dilmista na comissão do impeachment teria direito a destacar para uma votação em separado dois requerimentos, sendo um deles o pedido para anexar as gravações em que Sérgio Machado gravou políticos, entre eles os que o senador e ex-ministro Romero Jucá e o ex-presidente José Sarney discutem rumos da Operação Lava Jato e, nas palavras de Jucá, como "estancar a sangria" provocada pelas investigações. Depois de deixar a comissão em protesto, Cardozo disse que o Senado atua como juiz no processo de impeachment e que "um juiz não decide em globo requerimento". "Ele tem que fundamentar cada um deles e abrir espaço às partes. Simplesmente violentaram o direito de defesa. Falar não é suficiente, provar é necessário, mas me permitam que eu prove", criticou. Ele pretende apresentar uma série de recursos ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski, que preside a fase de plenário do impeachment no Senado, para que o direito de defesa seja garantido e eventualmente seja refeita a votação das provas que serão colhidas nesta fase do procedimento contra Dilma. "Não querem nem perder tempo com votação. É uma situação que não é um processo de impeachment nem em sua ritualística. Nem o rito é respeitado mais. Eles querem acabar o processo em junho. Nem requerimento eles querem mais. É uma violência brutal. Afirmamos e reafirmamos que está em curso um golpe de Estado no Brasil e mais do nunca essa sessão simbolizou uma violação ao direito de defesa", criticou. "Quero continuar fazendo a defesa na forma da lei, mas se é para fazer uma defesa assim e consumar um golpe assim... Nem mais as aparências eles estão mantendo. Talvez as fitas tenham apressado o desejo de votar logo. Quero fundamento para cada requerimento", completou. Cardozo argumentou que os grampos de Sergio Machado são cruciais para demonstrar a tese de que todo o processo de impeachment estaria maculado por "desvio de finalidade". "Não posso trazer as provas para o processo de que há uma evidente articulação para que, sem consistência, esse impeachment seja aprovado?", protestou. Segundo Cardozo, os grampos de Machado evidenciariam que o impeachment só teve seguimento porque seria a alternativa para acabar com as investigações contra políticos suspeitos de embolsar propina de contratos fraudados na Petrobras. Para o advogado, o objetivo real da ação de impedimento representa "desvio de poder" e todo o processo, que oficialmente se embasou nos crimes de responsabilidade resultantes das pedaladas fiscais e da edição de crédito suplementares sem aval do Congresso, teria sido utilizado apenas para conter as apurações da Polícia Federal sobre a Lava Jato. Após o tumulto ocorrido na comissão processante, os senadores aprovaram requerimentos exatamente como havia defendido o relator Antonio Anastasia. Com isso, além da negativa sobre fitas, foram rejeitados pedidos para que outras provas relacionadas ao petrolão, como o envio de dinheiro do contribuinte brasileiro a países alinhados ao então governo petista, como Cuba e Venezuela, fossem consideradas no impeachment. Pela proposta do senador tucano, a presidente Dilma Rousseff deve ser intimada para interrogatório no processo. Por ora, o senador listou 21 testemunhas, entre as de defesa e de acusação, para embasar a tramitação do processo, mas admitiu que as oitivas podem ser ampliadas. Isso porque ele considerou que é possível arrolar oito testemunhas por fato listado na acusação - pelo menos quatro decretos de crédito suplementar, além da operação de liberação de recursos do Plano Safra, considerada uma pedalada fiscal. O relator ainda negou - e foi acompanhado pela comissão - a possibilidade de o doleiro Alberto Youssef e o empreiteiro Ricardo Pessoa serem testemunhas no processo de impeachment e o pedido da defesa de Dilma para que um "organismo externo, internacional e independente" faça perícia e auditoria por considerar que "o TCU não dispõe da independência e imparcialidade necessárias por estar atuando na análise das contas presidenciais de 2015".

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