terça-feira, 3 de abril de 2018

Leia o artigo do filósofo e jornalista Luis Milman - A ralé e a desordem institucional

O País atravessa momento de aguda crise política, com a dissolução de fato de seu sistema partidário, imerso na corrupção revelada pela Operação Lava-Jato e com a deterioração de sua escora institucional, o sistema judicial superior, vazado pelo casuísmo atrelado a interesses oligárquicos. 

O estado brasileiro está, assim, em condição falimentar. Os partidos, numa república constitucional, são entidades que representam o povo, em seus diversos segmentos, apenas se tiverem a capacidade de o organizarem politicamente e, nessa medida, o afastarem de tentações extravagantes, como a salvação autoritária. Para isso, devem possuir capital moral e consistência programática, justamente as virtudes cívicas das quais, nos últimos anos, os grandes partidos nacionais se afastaram. 

Já no plano judicial, a degeneração ocorre quando a aplicação da justiça se torna o seu contrário, passando a ser condicionada pela proteção de grupos ou indivíduos privilegiados. O Supremo Tribunal Federal, que se tornou palco rotineiro de disputas de vaidade e de acusações de má conduta recíprocas por parte de seus membros, de modo inaceitável, ainda se expõe à sociedade como fonte de insegurança jurídica, de desordenamento, pelo simples fato de admitir, ou pior, ameaçar, alterar decisão consagrada em jurisprudência recente, quando está em jogo a execução da pena de um ex-presidente, por corrupção e lavagem de dinheiro. 

Uma interpretação vicária, nesse caso, não passará de casuísmo de motivação inconfessável e indisfarçável, seja lá qual for a forma embelezada com que venha a se apresentar. Não é por menos que essa ameaça motivou, de forma inédita, a manifestação de milhares de juízes e membros do ministério público pela manutenção da prisão após julgamento em segunda instância, o que, por si só, revela a desorganização institucional interna vivida pelo poder judiciário, com a corte suprema dissociada das demandas das instâncias inferiores.

O pano de fundo político da crise é, assim, o descompasso, hoje evidente, do que se espera das instituições numa sociedade pacificada e o que, em contraste, estão nos oferecendo seus meios de organização, os grandes partidos e o sistema judicial. 

Os partidos, dilapidados pela ausência de capital moral, e a alta corte, imersa em degradada parcimônia para com um criminoso, comportam-se passivamente diante da grotesca rebeldia do ícone da mera ralé, que não pode ser confundida com o povo. A ralé não almeja a ordem representativa ou jurídica, como o povo o faz, mas busca na figura de um homem forte, de um líder, o modo pelo qual se expressa politicamente. 

É um erro pensar que a ralé se compõe apenas do populacho ignorante. Dela também fazem parte intelectuais e sectários de todo o tipo que odeiam a sociedade e a ordem. Ela se vê representada na figura politicamente desafiadora de Lula, que sobrevive, apesar dos crimes, dos escândalos e das trapaças públicas, nos ritos de uma esquerda que não tem mais nada a oferecer ao povo além da integralidade da mentira. E somente a ralé aceita esta aliança. 

A enganação metódica proposta por Lula e pelo PT disputa espaço com a ação moral na política, e dela surgem caravanas de um condenado, que ofendem o senso cívico comum. Esse mesmo senso exige, hoje, a prisão de Lula. Assim, veremos, nesta quarta-feira, quem será vitorioso no embate que se prenuncia: se a ralé, que deseja subverter a ordem das coisas para impor seus instintos à nação, ou o povo que, mesmo de forma inarticulada, não suporta mais ser o polo passivo da desordem institucional.

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